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Por que você escreve?

Atualizado: 25 de ago. de 2022



Antes de revelar o motivo por que escrevo vou te contar um segredo. Verdade seja dita! Na boa, a vida de quem escreve, dos escritores renomados aos tentantes e até mesmo a vida daquela pessoa que se engaja a escrever num diário, não é um conto de fadas! A vida de nenhum ser humano é um conto de fadas! Vamos reconhecer!


Então!

Escrevo, não porque está tudo bem. Porque meu jardim está florido. Porque tudo segue em harmonia. Perfeitamente, do jeitinho que sonhei e planejei. Não! Estaria maquiando essa conversa. A beleza me motiva, mas a dor é uma velha amiga que me faz sentar, rever, escrever ou apenas tentar...


É engano pensar que a escrita brota apenas de momentos perfeitos. Jardins floridos e dom. Julgava ser assim. Quando contemplava e admirava escritores. Só que não!!! Escrever é trabalho árduo! É literalmente um parto. Requer tempo. Profundidade. Liberação de bagagens com excesso de peso.


Os enganos, autoenganos, quedas, descuidos, desordens, gatos, ratos, baratas e dragões fazem parte do meu cenário cotidiano que me impulsiona a renascer e a escrever. São os antagonistas da minha jornada cuja função é me fazer continuar e não estagnar.


Então, por que escrevo?


Escrevo para organizar as ideias e o caos local. Para trazer luz à minha consciência. Fazer planos pé no chão. Gerenciar as emoções. Manter uma conexão com o sagrado. Escrevo porque nem sempre as coisas vão bem. Nem sempre as coisas saem do jeito que planejei. Escrevo porque a angústia e a impermanência existem. Isso é fato! É lei! Negar os fatos, a lei e as emoções geram positividade tóxica. Mas escrever me faz enxergar a beleza por trás disso tudo. 


Ninguém passa por esse mundo sem experimentar a nobre e grande verdade que Buda descobriu, meditando a sombra da árvore buddhi. “A vida é sofrimento!” Eis a primeira nobre verdade proferida por Buda Shakyamuni.


Então, escrevo porque sinto, visceralmente, essa nobre verdade atravessando a minha vida, cotidianamente. E a vida de todos os seres, ao meu redor. Escrevo porque existe drama. Escrevo porque existe a cura. Do drama. A escrita tem me tirado do drama, quando consigo. Percebo a escrita como uma escolha corajosa de auto resgate emocional, espiritual e de alma.



A escrita tem me ajudado a gerenciar as emoções. Emoções são emoções, você sabe! Elas não são ruins nem boas. Observá-las, registrá-las num caderninho, produzir um texto ou alguns versinhos são possibilidades de um caminho amoroso para consigo mesmo. Sinto como um exercício de autocompaixão. De paciência e permissão. Deixar que o tempo ou qualquer passarinho nos traga as respostas mais poéticas, leves e bonitas do que reações intempestivas e aviltantes.


Na escrita também se resgata a alma. Porque temos sede, fome, necessidade imperiosa de alimentá-la e preservar esses espaços de alma. Ouvi-la, senti-la, deixar que ela se expresse ao invés de dar voz e empoderar os caprichos de nosso ego vaidoso, eis um caminho possível de auto resgate e de saída do drama para a cura, para a beleza.


Um suspiro de alma sempre acontece quando escrevo. Daí percebo que estou, simplesmente, no aqui e no agora. Não no drama que me acompanha quando insisto em olhar para ele. O drama quando povoa a mente, como aquele falatório incessante, é muito maior e mais doloroso quando o transformamos em palavras e deixamos ali, repousando, numa folha de papel em branco. Em palavras o drama diminui, ligeiramente, de tamanho.



Percebo que se não escrevo, as palavras me acordam no meio da noite como que dizendo, escreva-me ou te devoro. Elas não me deixam dormir quando há algo a ser escrito, desenvolvido, compreendido. Quando escrevo, relaxo. Elas me liberam e assim sigo, dormindo na hora de dormir e caminhando na hora de caminhar. 


Veja! A escrita tem o seu ápice de dor, de recusa, de transbordo de emoções, mas também há o clímax, o alívio, a alegria, a liberação. Escrever é sobre ver o lado bom do lado ruim. Talvez seja isso. Uma necessidade premente de focar no lado bom da vida. Agradecer. Enxergar as benesses das grandes contradições que são os antagonistas da nossa jornada.


Se bem que, a vida de um escritor, renomado ou tentante, e daquela pessoa que escreve em diários, não se resolve só porque ele conseguiu escrever. Mas fazer isso nos tira do drama; nos faz romper a resistência e nos coloca no caminho do Dharma, do propósito; nos ajuda a colocar um pouco de luz onde tudo se tornou sombrio.


Enquanto escrevo as respostas vão chegando e as coisas resolvíveis, se resolvendo. Foi o que aconteceu comigo.



“Ciclo - Uma poética dos sentidos e da Percepção'' é o meu primeiro livro, e concluir esse trabalho foi um renascimento providencial. Conquistei o elixir que precisava, um remédio e um caminho que me trouxe beleza, alegrias e outros desafios. As respostas que estava procurando ainda estão chegando, no tempo, com o vento, como brisa suave, de acordo com a minha capacidade de assimilar outros conhecimentos e novos saberes. 


Para minha alegria, “Ciclo” também tem sido um elixir para muitos leitores e leitoras que têm compartilhado comigo suas vidas, dores, sonhos e projetos engavetados. Agora, vida que segue, escrevendo e transmutando dramas e dores em arte e beleza.



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